quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Quando a lealdade se tornou “líquida”

Imagine uma gestante, pronta a dar a luz, começam as dores do parto e a medida que estas aumentam ela grita: “-EU DESISTO!” Qual seria sua reação a respeito? Mais ainda, qual seria a sua surpresa ao testemunhar uma cena, a princípio tão insólita? Afinal, desistir de um parto seria o que? A morte da mãe ou da criança?

Enfim, por que faço essa pergunta? Simples, por que especialmente hoje parece mais fácil desistir de uma boa luta do que continuar. Se algo está errado com sua Nação o que você faz? Oras, muda de nação, simples assim! E o melhor, ainda leva junto os títulos do país anterior. Simples assim? Não exatamente, pois se leva o título mas se abandona a honra.

Calma, não se exaspere! A questão é mais simples do que parece, se trata afinal de conservar em si um senso de comunidade, um espírito segundo o qual não é possível abandonar seu país, mas ficar com ele até o fim, aconteça o que acontecer. Loucura? Não! Lealdade no sentido mais simples e ao mesmo tempo completo da palavra.

O micronacionalismo, de modo geral, parece ser o locus da lealdade volátil, basta que as coisas se aqueçam um pouco e aquele guerreiro pronto a tudo enfrentar em nome de seu país, simplesmente foge. Usando das belíssimas metáforas de Zygmunt Bauman, é uma autêntica lealdade “líquida”, totalmente adaptativa não às ordens da Nação mas ao simples interesse pessoal.

Interesse pessoal, de conservar títulos, cargos, receber favores. Interesse pessoal em partir sempre para o lado que estiver “mais forte”, afinal, para muitos ideologia simplesmente é uma palavra morta no dicionário. E assim, aquele Schettino abandona sua micronação, seu povo, seu líder tudo por que não crê num porvir, recolhe-se simplesmente à certeza de que o navio está adernando.

Enfim, abandona-se um país como um comandante que falhando às suas obrigações, abandona o navio. Talvez essa transitoriedade que o micronacionalismo contempla acabe sendo refúgio para aquele que não vê sua micronação – DE FATO – como seu país, que não vê seu governante – DE FATO – como seu líder. Abandona a Nação não por que está encerrando sua vida micronacional – o que é bastante digno e admirável –, mas por que encontrou vantagens melhores em outras paragens.

Lealdade, responsabilidade e coragem, caro leitor, não são apenas palavras, são perspectivas, sustentáculos de uma hombridade que não foi solapada pela conveniênia, provas de que acima do “eu” ainda existe o “nós”. No micronacionalismo, como em qualquer outro ambiente da vida, talvez valha à pena recordar, quando tudo parecer perdido, as palavras fortes e providenciais do oficial da capitania dos portos da Itália, Gregorio Maria De Falco, que disse: “-VADA A BORDO, CAZZO!”

Labrus Peregrinus
Patriarca da Dinastia Peregrina